João já era um rapaz de vinte anos, crescera alto e forte como o pai, mas com cabelos da cor dos cabelos da mãe.
Para tentar relaxar um pouco e fugir do estresse da faculdade na Terra, fora passar alguns dias na casa do seu tio Sieg, em Arlon, e sempre que estava lá gostava de ajudá-lo e a seu primo, Karlon, na oficina da família.
– Tio, eu perguntei para o meu pai outro dia, mas ele disse que era melhor perguntar para ti. O que afinal é a chamada “prata trabalhada”, que é o material do qual as espadas dele são feitas?
– Ué, algo que o tio Lukhz não sabe? – provocou Karlon, rindo.
– Mais respeito com o teu tio, meu filho. Meu irmão gosta de estudar de tudo, mas não sabe tudo e nem sai por aí afirmando que sabe tudo. Agora, se tu continuares a falar mal dele, vou ter que contar para ele antes do teu próximo treino com ele…
– Tu não farias isso, pai, faria?
– ….
– É, faria….
– Deixando as bobagens do Karlon de lado, João, me ajude aqui a guardar as ferramentas que eu já te explico melhor.
– Claro, tio.
O trio guardou as ferramentas, arrumou a oficina, passaram na cozinha, pegaram uma grande jarra de suco fresco e foram se sentar no jardim que havia junto casa onde Sieg vivia com sua família.
– Bem, sobrinho, a prata trabalhada, também conhecida como prata mágica, prata élfica ou prata anânica, nada mais é do que uma liga envolvendo aço, prata e um minério raro conhecido como solv.
– Solv? Acho que nunca ouvi falar dele.
– Normal. Como eu disse, é um minério bem raro que, basicamente, é extraído nas Montanhas Negras aqui no continente central e em algumas poucas minas no continente de Orbi. Eu já ouvi um boato de ele ser abundante em algumas ilhas das Terras Ocidentais, mas, como eu disse, é só um boato. Quando extraído, ele é um minério claramente metálico, de coloração cinza chumbo, com um leve brilho prateado. Teu pai e eu já nos debruçamos sobre vários e vários livros de geologia, física e química lá da Terra tentado achar algum minério ou elemento químico similar lá na Terra. Se conseguíssemos descobrir algo meramente similar, talvez conseguíssemos sintetizar o solv, ou algo parecido, usando magia e alquimia, mas não chegamos nem perto.
– Você falou que a liga tem vários nomes. Por que isso?
– Porque ninguém sabe quem a criou primeiramente. Os anões da Montanha Negra falam que foram eles, os elfos que habitavam a região onde hoje é o reino de Arlon falam que foram eles e os anões da Cordilheira Central também falam que foram os elfos, talvez para implicar com os seus primos da Montanha Negra.
– As armas que os membros da nossa família quase todas tem um pouco de prata trabalhada, né tio?
– Quase todas não, primo, todas, meu pai não deixaria ninguém da família usar algo de qualidade inferior, só variando a proporção, não que isso faça muita diferença.
– Como não faz diferença, Karlon? Pelo que me conste, a física e a química daqui não são muito diferentes da física e da química lá da Terra. E, segundo estas, quanto mais um metal é diluído numa liga, mais fracas ficam as características dele presentes na liga.
– De fato, João, isso também ocorre aqui em Nortivy, com a exceção justamente da Prata Trabalhada. Quando diluída até uma certa proporção com aço e prata, ela mantém as suas características, com o objeto tendo praticamente as mesmas qualidades de um objeto que seja feito de Prata Trabalhada pura. Porque isso ocorre, não me pergunte. Segundo a sua tia Liliana, isso ocorre porque estamos falando de uma liga mágica e a magia tende a “driblar” as leis da natureza quando lhe convém.
– Posso fazer mais uma pergunta?
– Quantas quiser, sobrinho.
– A espada do meu pai é feita praticamente de Prata Trabalhada pura, certo? Ao menos a lâmina é, correto?
– Sim.
– Existe mais alguma arma da família que chega perto desse grau de pureza?
– Sim, a espada da sua irmã, Gala. Prata Trabalhada é cara, por isso raramente se trabalha com ela pura, mas quando a sua irmã ascendeu à capitã da Guarda Real de Arlon, o seu avô, Tauron, me mandou algumas peças de Prata Trabalhada para que eu derretesse e fizesse uma espada digna da mais nova capitã da história de Arlon e Erdan. E foi o que eu fiz.
– Vovô realmente não esconde que a Gala é a favorita dele – riu João – Agora, só não podemos deixar a Mariana saber por que ela vai ficar reclamando por um século ou mais.
Sieg e Karlon, que conheciam bem o gênio da irmã gêmea de João, riram do comentário do rapaz.
– Agora, mais uma pergunta, eu juro que é a última.
– Faça, sobrinho, faça.
– Se eu conseguir juntar prata trabalhada o suficiente, o senhor me forja um par de espadas irado como as do meu pai?
– Com o maior prazer, meu sobrinho, mas para isso terás que juntar bastante dinheiro.
– Não tem problema, tio, nunca tive medo de trabalhar.
O elfo riu, fez um cafuné na cabeça do sobrinho e, alegando que havia algumas tarefas pendentes ainda na oficina, se levantou e foi em direção à esta.
Os dois jovens prontamente se levantaram e foram com ele, se oferecendo para ajudar.